Publicado em 08/10/2020
*Por Marisa Lobo
“Vai prà Venezuela!” é quase um ditado no mundo inteiro. No Brasil, é tão usual como “a nossa bandeira jamais será vermelha”. O alvo desses cantos é, comumente, a esquerda e todo centrista tautologicamente tímido. O propósito é aquele de deixar em evidência a hipocrisia que os esquerdistas detêm nas narrativas que eles usam.
Mas, o que o mundo nem está percebendo é que essa provocação turística é só usada para comunicar uma parte da realidade. A verdade para surpresa de vários é que, a Venezuela não é um paraíso para a esquerda só, mas também, para os liberais e as suas adjacências ideológicas ainda mais utópicas.
A razão de porquê Venezuela é um paraíso para a esquerda é simples: comunistas, pedófilos, corruptos, narcotraficantes e cadelas socialistas e centristas controlam o país. Ou seja, a rentabilidade de morar lá é, para a esquerda, fundamentalmente política. Não é simplesmente porque o país esteja sob mandato totalitário. Esse elemento tem a mesma plus valia que tem uma cerveja ou uma caipirinha na beira da Copacabana: já era bom, agora presta mais.
Não tem muita novidade nessa cara da moeda… it’s the same old song. Mas, porquê essa doideira de dizer que os liberais (& Co.) são ideais candidatos idealistas para morar na minha Venezuela? Vamos lá.
Primeiro, na Venezuela, de fato, não existe um Estado. Juridicamente é assim, pois o processo Constituinte liderado pelo Chávez em 1999 onde constituiu o atual aparato de poder é írrito, pois o mecanismo utilizado não existia na Constituição anterior e o Texto Fundamental que foi imposto —graças a uma emenda ilegal nas disposições transitórias da Constituição prévia— era absolutamente distinto ao que foi aprovado pelo povo, consolidando o estabelecimento de uma Constituição paralela.
O argumento fático é que para um Estado existir são precisos vários elementos que o façam existir. O primeiro é o controle (1), e o controle é exercido através das instituições (2), ou seja, estruturas sistêmicas que possam canalizar as necessidades da população e possam induzir atos. Na Venezuela não existem instituições políticas que mantenham ou produzam uma ordem (3) que garanta o exercício da cidadania, dos direitos, o cumprimento dos deveres e a punição daqueles que não cumpram os deveres nem respeitem os direitos.
Porém, a lei —legislada— é só fetiche verbal. O controle, ora “elemento impositivo”, ora imperium, existe, não num “Estado” propriamente dito —pois não existe—, nem num aparato por um consenso leviatânico absoluto: o controle só é exercido por uma organização criminosa cuja lei é a vontade da hierarquia malandra dos seus chefões com o fim, não de satisfazer as necessidades da cidadania nem da expansão imperial, mas com o fim de salvar, garantizar, otimizar e expandir as operações criminosas —tráfico de pessoas, narcotráfico, tráfico de armas, terrorismo, corrupção, lavagem de dinheiro, etc.— que os fazem tão ricos como um Elon Musk.
Ora, a destruição do Estado ou a inexistência deste é uma bandeira totalmente apoiada, planejada e proposta, não só pelos Liberais & Co., mas pela literatura que os seus “pensadores” já produziram vastamente e, surprise, surprise!... pelos comunistas desde que o pai deles falou daquilo, no Manifesto em 1848.
Os liberais e o seu gangue, vem da visão francesa da liberdade onde um homem é livre porque lhe é permitido sê-lo (laissez faire, laissez passer), e não porque pode sê-lo. Os comunistas, considerando o Estado uma criação burguesa, julgam que este deve deixar de existir para o povão oprimido poder alcançar a liberdade. As duas acepções societais são absolutamente dialéticas e não aceitam uma existência —real, orgânica— do indivíduo sem o Estado lhe dar a categoria de, indivíduo.
Ora, na Venezuela, você pode comprar e usar armas, pode comprar órgãos, crianças (Rothbard dixit) e até terminar o dia comprando a sua Heineken importada; não existe arrecadação de impostos, a economia está dolarizada, pode abortar sem impedimento, a prostituição começa na esquina do seu quarteirão e chega até os mais altos níveis da política. Ou seja, a utopia liberal, paradoxalmente, pode coexistir com a utopia comunista porque a passividade liberal, banal e submissa, é a peça perfeita para o quebra cabeça comunista, totalitário e atropelador.
Não é que os liberais por si mesmo, sejam ruins colaboradores do comunismo. Mas nessa fraqueza deontológico-política dos liberais que obriga (imperativamente) a sempre recusar o poder e —num giro psicótico de somatização— sentir nojo deste, existe a oportunidade de ouro para as mãos comunistas pegarem o bolo inteiro —como fizeram na Venezuela. Ou seja, os nossos caros liberais partindo do suposto absoluto da liberdade individual e da necessidade radical e ôntica da liberdade ilimitada —liberdade que só pode existir após a destruição do Estado—, encontraram a sua utopia na Venezuela comunista, criada através da destruição... da Venezuela inteira.
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